Número de processos por etarismo dispara na Justiça do Trabalho

Número de processos por etarismo dispara na Justiça do Trabalho

Número de ações trabalhistas sobre o tema passou de três, em 2018, para 403 em 2023, um aumento de mais de 13.000% em cinco anos

Etarismo – Em cinco anos, o número de ações na Justiça do Trabalho motivadas por etarismo (discriminação por idade) passou de três, em 2018, para 403 processos em 2023, um aumento de mais de 13.000% em cinco anos. O levantamento foi feito pelo escritório Trench Rossi Watanabe por meio da plataforma de jurimetria Data Lawyer e obtido com exclusividade pelo portal Valor Econômico.

A tendência é que este número cresça ainda mais, tendo em vista que 2024 já registrou mais de 340 casos sobre o assunto até o fim de setembro. E a jurisprudência, dizem juristas especializados na área, é favorável ao trabalhador. As decisões de primeira e segunda instâncias e até do Tribunal Superior do Trabalho (TST) garantem reintegração ou compensação financeira.

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O valor das indenizações pleiteadas também aumentou exponencialmente. No ano de 2018, por exemplo, foi registrado um total de R$ 4,47 milhões e, em 2023, R$ 174,64 milhões. Este ano, os valores das causas já somam R$ 79,6 milhões, conforme o levantamento.

Exemplos

Um desses casos é o de uma auxiliar de limpeza que alegou discriminação por parte do supervisor. Uma testemunha do processo, que tramita na 2ª Vara do Trabalho de Araçatuba (SP), contou que o gerente vivia “zombando dos funcionários”, dizendo que a ajudante “não servia mais para trabalhar porque estava velha”. A juíza Suzeline Longhi Nunes de Oliveira decidiu favoravelmente à trabalhadora.

“A conduta do supervisor, agindo com etarismo, desqualificando o trabalho da reclamante junto aos colegas, implica tratamento inconveniente e desrespeitoso, e merece censura, mediante o arbitramento de indenização, com o objetivo de compensar os naturais e previsíveis transtornos suportados pela parte reclamante e também com a finalidade de inibir semelhantes comportamentos”, escreveu a magistrada.

A sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região por unanimidade, e a 4ª Câmara ainda aumentou o valor da indenização por danos morais de R$ 3 mil para R$ 6,5 mil. Também foi concedido adicional de insalubridade de 40% sobre o salário mínimo por falta de equipamento, como luva, para a limpeza de banheiros (processo nº 0010487-95.2023.5.15.0061).

Em outra ação, um recepcionista ganhou uma causa de danos morais por ter sido assediado pela gerente “por meio de etarismo e ócio forçado”. O juiz Adib Pereira Netto Salim, da 2ª Vara do Trabalho de Vitória (ES), apontou que “a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação é direito fundamental e integra o rol de core obligations [obrigações básicas] da OIT [Organização Internacional do Trabalho]”.

Uma testemunha confirmou a discriminação e disse que houve demora em fornecer senha de acesso ao sistema, perseguição e ofensas em razão da idade e das dificuldades do reclamante em desempenhar as atividades, já que não havia recebido treinamento prévio, o que fez o juiz arbitrar a condenação em R$ 3 mil (processo nº 0001225-50.2023.5.17.0002).

Cenário inédito

Segundo a análise do escritório responsável pelo levantamento, o principal motivo para o aumento dos processos é o convívio inédito de seis gerações no mercado de trabalho, o que propicia divergências. A rotina entre veteranos nascidos até a segunda guerra mundial (1945) até a geração mais recente nascida a partir de 2010 (alpha) expõe as diferentes visões de mundo dos funcionários, criados em contextos históricos diversos, além de regime e formas de trabalho quase opostas.

Outro motivo apontado é a adoção pelas empresas dos princípios de governança ambiental, social e corporativa (ESG na sigla em inglês), que estimulam a admissão de trabalhadores mais plurais. Ao buscar promover equidade, tornam-se mais frequentes conflitos geracionais que podem terminar em litígio.

Para a advogada Leticia Ribeiro, sócia do Trench Rossi Watanabe, a presença de funcionários mais jovens tem influenciado a alta das ações, pela nova geração ter maior consciência dos limites e o que pode ser questionado no ambiente de trabalho.

“O nível de tolerância para fins de qualidade no ambiente de trabalho está maior hoje em dia, a régua está mais exigente e não só para os mais jovens. Os mais sêniores estão mais à vontade para trazer esses questionamentos. Antigamente era difícil ver as pessoas trazerem esse debate para a Justiça do Trabalho”, afirma.

Arcabouço legal

Segundo a advogada Priscila Kirchhoff, também sócia do escritório, o crescimento está relacionado também a uma aplicação cada vez mais frequente da Súmula 443 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que presume a dispensa discriminatória em caso de doenças graves, como o HIV. Apesar de não tratar sobre etarismo, ela promoveu o debate sobre demissões por preconceito.

Apesar de não haver uma lei específica sobre etarismo, há decisões favoráveis aos trabalhadores que tomam como base a Lei nº 9.029/1995. Em seu artigo 1º, a lei proíbe “qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros”.

O Judiciário leva em conta também a própria Constituição Federal, que no artigo 3º, parágrafo IV, dispõe sobre o assunto, e a CLT, no artigo 373-A. Há ainda a Lei 10.741/2003, conhecida como Estatuto do Idoso, que veda a discriminação específica por idade e a fixação de um limite máximo para admitir ou manter uma pessoa no quadro de empregado. “É um arcabouço jurídico bastante robusto”, diz Leticia.

(Com informações de Valor Econômico)
(Foto: reprodução)

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