Data center – O Ministério Público Federal (MPF) solicitou, no último dia 12, que o governo do Ceará apresente explicações sobre a concessão da licença ambiental para a instalação de um data center da ByteDance, empresa controladora do TikTok, no Complexo Industrial e Portuário do Pecém, na região metropolitana de Fortaleza.
Uma perícia técnica contratada pelo MPF concluiu que o licenciamento ambiental do empreendimento, baseado em um Relatório Ambiental Simplificado (RAS), foi considerado “tecnicamente inadequado e insuficiente para avaliar a viabilidade ambiental do data center” da empresa chinesa.
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De acordo com o Ministério Público, o projeto representa um “potencial vetor de agravamento da escassez hídrica, intensificação da vulnerabilidade climática, aumento do risco de insegurança alimentar e violação de direitos socioambientais da região”. A Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace) tem o prazo de dez dias para se manifestar.
Procurada, a Semace não respondeu até a publicação desta reportagem. Em audiência realizada antes da elaboração do laudo pericial, o órgão ambiental informou que optou pelo RAS porque não existe tipologia específica para complexos de processamento de dados nas resoluções do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema).
“Diante dessa particularidade, esta Superintendência solicitou ao empreendedor a elaboração de um Relatório Ambiental Simplificado (RAS), por entender que esse tipo de estudo se adequa de forma mais apropriada às características técnicas do empreendimento.”
Em nota conjunta, a ByteDance e a empresa de energia renovável Casa dos Ventos – responsáveis pelo pedido de licenciamento ambiental – afirmaram que o processo está sendo conduzido em conformidade com a legislação vigente e seguindo as determinações da Semace.
As empresas disseram ainda que não tiveram tempo suficiente para analisar o conteúdo do documento elaborado pelo MPF, mas sustentaram que o empreendimento terá impacto hídrico muito reduzido.
Questionamentos e pedidos de suspensão
A investigação do MPF foi iniciada a partir de solicitação de lideranças do povo indígena Anacé e de cinco organizações da sociedade civil. Os grupos defendem a suspensão imediata do processo de licenciamento ambiental do complexo de processamento de dados.
Nos autos do processo, a Semace também contestou a necessidade de elaboração de um Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), alegando que a área onde o empreendimento será instalado “encontra-se situada em zona rural e distante de núcleos habitacionais adjacentes que possam justificar a necessidade de solicitação do referido Estudo”.
O órgão ambiental destacou ainda que o RAS teve como base um Termo de Referência que previa a “realização de um estudo mais robusto e detalhado dos potenciais impactos ambientais”.
Dimensão do projeto e exigência de estudos mais amplos
Segundo o perito do Ministério Público da União Valdir Carlos da Silva Filho, o porte do empreendimento – com potência instalada de 300 megawatts e consumo de água estimado em 88 metros cúbicos por dia, quase três vezes acima dos 30 metros cúbicos inicialmente previstos — exigiria a realização de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA), do Relatório de Impacto Ambiental (Rima) e de consulta prévia às comunidades tradicionais que vivem a poucos quilômetros do local.
“O licenciamento de projeto com essa magnitude de consumo hídrico deveria ter por requisito primário a demonstração de viabilidade hídrica por meio da emissão de outorga preventiva por órgão competente”, afirma o laudo pericial.
O documento também aponta “fracionamento indevido” no processo de licenciamento, ao tratar de forma separada os impactos da linha de transmissão, da subestação, da estação de tratamento de esgoto, dos 120 geradores a diesel e do sistema de resfriamento do data center.
Para o perito, a ausência de audiência pública “infringiu um pilar democrático do licenciamento ambiental” e a emissão das licenças prévia (LP) e de instalação (LI) configurou uma “falha gravíssima”, em desacordo com os princípios da prevenção e da precaução. “Ao empreendimento Data Center Pecém não poderia ter sido emitida licença ambiental prévia, muito menos a licença de instalação.”
Posicionamento das empresas
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), uma das entidades que recorreram ao MPF, afirmou que “a perícia desmonta a narrativa de que esse é um empreendimento simples ou de baixo impacto”.
A Casa dos Ventos declarou que obteve a licença ambiental após apresentar um estudo técnico elaborado por equipe especializada, fundamentado em normas e boas práticas vigentes. “A empresa reforça que seguiu rigorosamente todo o processo legal aplicável para o licenciamento e reitera sua política de transparência e responsabilidade, principalmente em relação à sustentabilidade.”
Segundo a companhia, a unidade utilizará um sistema fechado de refrigeração líquida, que reduz o consumo de água por não haver fase de evaporação, diferentemente do que ocorre em grandes data centers nos Estados Unidos.
“Hoje, o projeto na primeira fase está dimensionado para um consumo de menos de 30 metros cúbicos por dia, que é equivalente a 70 residências”, afirmou João Caldas, diretor de novas tecnologias da Casa dos Ventos, em entrevista à Folha.
No entanto, documento apresentado pela empresa à Semace indica a necessidade de um volume estimado de 2.647.100 litros de água ao longo de 30 dias para o preenchimento inicial do sistema de ar-condicionado. Esse montante corresponde a cerca de 88 metros cúbicos diários, o equivalente ao consumo de mais de 200 residências.
De acordo com a perícia do Ministério Público da União, o consumo de energia do empreendimento – com potência instalada de 300 megawatts – supera o de 99% dos municípios brasileiros, o que reforça a necessidade de elaboração de Estudo e Relatório de Impacto Ambiental.
(Com informações de Folha de S.Paulo)
(Foto: Reprodução/Freepik/user19736439)


